terça-feira, 23 de junho de 2015

Sobre satisfação.


     "Você sabe por que não existe perfeição?"
     Questionou-me e tragou seu maldito cigarro, do qual a fumaça mal cheirosa, alcançava-me inevitavelmente as narinas. O tempo que pensei tornou a pergunta retórica.
     "Porque não existe satisfação plena, permanentemente".


Carlos Eduardo Taveira.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

O Cronista lírico

Ele estava lendo uma de suas próprias crônicas favoritas, fazia isso como se nunca tivesse a lido, como se mesmo não a houvesse escrito, contudo não pôde evitar o esboço da mulher que aflorava entre as linhas, e que apenas ele conhecia. Questionou-se como algo que se apresenta tão belo em paisagem e sentido, com cenário e sonoro aos olhos e ouvidos, poderia representar algo que em si, de tão efêmero não teria podido nem mesmo fazer parte de sua história, numa futura e possível autobiografia. Questionou-se se seria necessário; tudo aquilo que escreve hoje já não é parte de sua vivência? Não é como se relatasse em cada crônica e cada poesia parte do seu eu? Ou de inúmeros “Eus”, ou as inúmeras faces de seu eu? Via-se como o ‘Lobo da Estepe’ de Hermann Hesse.
Todas as suas crônicas e poesias unidas a muitos outros de seus textos, revelariam sobre ele na posteridade, fazer uma autobiografia seria como escancarar a janela, lembrou-se do personagem de Milan Kundera, e sua analogia à casa de vidro dita por André Breton, “onde nada é secreto e está aberto a todos os olhares”, veio-lhe a mente outra imagem, a ave mãe que alimenta seus filhotes com a comida mastigada no bico, nenhuma das analogias fez jus ao que pensava, estava, além disso, com o pensamento na posteridade, não fazia questão de viver muito, apenas o suficiente para concluir sua obra, seria capaz de argumentar com a personificação da morte, como o cavaleiro medieval do ‘Sétimo Selo’ de Ingmar Bergman, que a desafia para uma partida de xadrez, antes que o leve ao outro mundo; assim poderia convencê-la a esperar mais um pouco, nada obstante a evocaria com suas próprias palavras, após percorrer sua última linha com suas ultimas frases e o ponto final.
Partiria então, mas deixaria tudo na Terra, nos seus textos os personagens sobreviveriam por ele, como uma espécie de truque, seria mesmo uma forma de ludibriar a morte? Decidira-se faz alguns anos: “Minha vida é escrever, isso é o que me mantém vivo”. Pensou em sua argumentação com a morte e concluiu que já havia realmente acontecido, por isso tamanho peso, tentou se livrar do peso criando um personagem que o carregava até o fim da história, mas percebeu que ao invés de destruir o peso, ele havia o eternizado, recentemente teve a vontade de exprimir seu espírito, expeli-lo com um sopro ou até mesmo enfiando a mão goela abaixo para lhe tirar de dentro, queria vê-lo dissolver-se no ar como desaparece a fumaça de um trago, certamente sentir-se-ia aliviado com tamanha libertação. Mas é inútil, seu espírito está preso à vida de seu corpo, e no seu espírito está contido o castigo ao qual está preso seu Eu, mas quem lhe prendera? A morte para garantir o acordo? Ou ele próprio? Ainda que não haja mais duvida de sua capacidade, daqui pra frente ele tem sempre a responsabilidade de escrever algo mais e aceita seu destino, poderia escrever eternamente e pensou que se a morte fosse mesmo inteligente, não aceitaria o acordo, afinal, para ele, havia sempre algo mais para ser escrito.

Carlos Eduardo Taveira dos Santos.


quinta-feira, 11 de junho de 2015

Le Cirque et la Vie.

     Espetáculo maravilhoso e macabro,  frente ao público se faz respeitável pelo risco de catástrofe inevitável.
     Atiçar o Leão indomável, fazer pirofagia sob a lona inflamável, acrobacias de um trapezista gracioso e admirável, tão leve quanto uma pluma, basta um erro e o abismo é seu fracasso.
     O palhaço de sorriso gasto e cansado pela alegria a qual foi fadado, engolidores de espada e mulheres barbadas já não impressionam mais, o ilusionista já se fez sumir da vista e deixou os aplausos para trás. 


Carlos Eduardo Taveira.