quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

A Fábrica Macabra do Velho Gordo. Parte I.



Em um país distante daqui,
numa terra desconhecida,
havia uma pequena cidade,
                                 que 
                      mantinha 
bem sua vida, 
com sua humilde população,
acostumada fazer à mão,
qualquer utensílio de necessidade
            ou
mesmo que por vaidade,
as vestes 
                e 
                   os
                        sapatos,
os brinquedos 
                    e 
                       os 
                           vasos
tudo artesanalmente criado.

Um dia 
a cidade foi descoberta,
pela fábrica do Velho Gordo,
                      vinda
de
outras terras.
Aqui
ele erigiu mais um galpão
e reuniu com uma festa
toda a população;
com um discurso
          eloquente
Velho Gordo
deixou contente
aquela inocente
civilização:

"Com esta Fábrica
              Macabra...
Quero dizer...
Com esta Fábrica
               fantástica,
tudo irá
       crescer,
sua cidade
se tornará magica,
logo vocês irão
             ver,
          haverão
prédios em vez de casas,
é o futuro que venho trazer."

E foi assim
                 que
Velho Gordo
                  os convenceu, 
                     e
na cidade se estabeleceu.
                              mas
na verdade
vejam só o que aconteceu,
                 qual a
   realidade,
do futuro
            que ele
                      prometeu.

Nenhuma pessoa
da cidade sabia,
      o que
dentro
da Fábrica Macabra
              havia,
como a fábrica funcionaria então
                           sem
                      funcionários
dentro do
                                     galpão?

Ninguém nunca
viu alguém entrar
                           ou
                                sair,
                                mas
havia um barulho infernal
e todos
conseguiam ouvir,
as chaminés
        emanando fumaça
          e 
as máquinas a zunir
fornalhas
            cheias de brasa
          e
a fábrica a produzir.

Carlos Eduardo Taveira dos Santos.





quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Bicho homem

   Aah... bicho homem, aonde vais tu? Como pisas tão firmemente o solo enquanto vosso semblante denúncia que estás à planar? Em que pensas tu, para sorrir com tanto caos ao redor? E como questionas a ti mesmo numa linguagem pseudo arcaica, obsoleta, retrogradada para supor profundidade em demasia? Arrisca-te em saber o que não sabes, culpa-o na falha, culpa-te na glória.
   Bicho homem, o que buscas tu? Queres felicidade, prazer e o que mais queres é companhia, e assim personificas tudo, torna tudo todos e todos tudo, como vasos de carne, recipientes de perfume; é a essência que queres, por mais que lhe atraia o frasco, decidirás pelo aroma do perfume, buscas o conteúdo.
   
Bicho homem, decifro-te nas conseguintes de meus questionamentos, compreendo-te e concluo: Encontrastes um alívio, uma sombra em meio ao árduo e escaldante caminho sob o Sol. Agora uma árvore pomposa convida-te a repousar sob a sombra, e tu não hesita em descansar, deitado sob a proteção das folhas, mira os galhos mais altos e discerne os frutos que saciariam sua fome, eles é que são o conteúdo da sombra externa, morrerias na sombra caso a árvore não lhe alimentasse.
   Aah... Bicho homem, encontra-te ai, amparado e acolhido, fascinado com a descoberta, queres subir a árvore e não teme a queda, queres apreciar o alimento e acabar com sua necessidade, queres o toque macio da sombra, como um carinho na pele queimada do sol, queres a brisa do vento e o olhar austero e superior que se tem lá de cima, e assim deixas até mesmo de ser homem, torna-te apenas bicho, pássaro que ali faz seu ninho e se refugia.



Carlos Eduardo Taveira dos Santos. 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O Dragão no Alto da Montanha.

   Havia um dragão no alto da montanha, quando filhote perdeu seus pais, para caçar não tinha manha, nem havia voado jamais; passou por fome tamanha até não resistir mais.
   Isolado no topo, sem poder voar, excluído de outros que pudesse devorar, arrastando seu corpo, vendo a asa atrofiar. Para que sair do ovo, para vivo se quebrar?

   Perdido na exclusão em meio ao nada, vivendo na solidão de sua morada, a única opção que foi encontrada, para o faminto Dragão, era comer a própria cauda.

Carlos Eduardo Taveira




quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Senhor de seu Futuro

Ao homem que merece tudo
Nada lhe entregue
Deixe que ele pegue,
Pois é um caçador no mundo

Andando para frente
E golpeado na diagonal,
No tabuleiro, peça banal
Sonha ser diferente

Uma casa de cada vez
Na expectativa de cruzar
O caminho até o patamar
Que lhe dará a validez

Sobrepujando o baixo escalão
Através da própria escada
Empunhando sua espada
E a brandindo com sua mão

Afasta o inimigo e atrai sua presa
Astuto como é um gato,
E encurralado como rato
Demonstra a verdadeira natureza

Ele não espera a chuva
Estiagem não importa
Caça e traz à porta
Degusta junto com a uva

Imbuído na sua batalha
Sua arma é afiada,
Sua língua laminada
Corta mais que a navalha

Senhor de sua própria hora
Molda o seu futuro
Pra ele não há muro
Que bloqueie sua história.


Carlos Eduardo Taveira.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Sentinela

Sentinela,
sem ter nela
sua tutela.
Sente dela
ser tão bela,
si tal cela
só tem ela.

Carlos Eduardo Taveira.



sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Trechos de Diálogos: No boteco.

   O homem é um animal carente; não se precipite aos equívocos sentimentalistas, ainda que o seja certo, o homem necessita da presença de um semelhante; não nos limitaremos ao ambiente familiar do habitat de sua casa. O homem não é um macho que ataca outros machos para lhes tomar o território ou acasalar com suas fêmeas, ao menos, não sempre; o homem se socializa ao seu semelhante, após as parcerias para caçar mamutes e durante a continuidade da história, o homem aprendeu a criar laços de amizade.
   A evolução levou o homem a construir locais nas suas cidades, onde podiam socializar uns com os outros e desenvolver tais laços; foi assim que surgiram as tavernas, hoje chamadas de bar, boteco, botequim; num desses, não muito diferente e nem muito mais evoluído que nenhum outro, um suposto boêmio solitário mirava o fundo do copo vazio que tinha em mãos, como já dissemos que o lugar é de socialização, não caberia ficar assim calado e tristonho, via-se que era recém chegado de outras bandas, como não conhecia ninguém, dirigiu a palavra ao taberneiro:
   "Seu moço, me vê aí mais uma dose dessa sua cachaça, que hoje eu tô meio aperreado."

   "E o senhor tem dinheiro pra pagar? Já pediu uma, duas, três, e dinheiro que é bom, eu não vi ainda não, já vou logo lhe avisando que não vendo fiado."
   "Sirva logo a dose pro rapaz", a voz foi o anúncio de um velho que se aproximava ao balcão, "não ta ouvindo ele dizer que está aperreado? Quando um homem está no fundo do poço, a única saída, as vezes, é o fundo do copo."
   "Mas, pra chegar no fundo do copo", rebateu o taberneiro, "precisa ter dinheiro pra pagar."
   "O senhor pensa que pinga é ouro? Por acaso ta vendo algum doutor aqui nessa birosca? Sirva logo o homem e pode deixar que eu pago."

   "Carece não", disse o forasteiro, "meu dinheiro é pouco sim, mas dá pra pagar minhas cachaça", pareceu ofendido, mas tinha o semblante determinado, "eu vim pra essa terra com uma mão na frente e outra atrás, e desde que cheguei aqui já fiz tudo quanto foi serviço, trabalhei de servente de pedreiro, aprendi a ser jardineiro, mas depois de ser gari, hoje em dia eu tô por aí, faço um bico aqui, faço outro ali."
   "Então já tem o meu conceito", concluiu o velho com satisfação, "eu sabia que o rapaz era bom sujeito, mesmo antes de ver seus calos nas mãos".
   O taberneiro serviu outra dose pro rapaz, e pôs mais uma para o velho que havia feito um sinal com o dedo.
   "Diga meu rapaz", disse o velho, " o que está te deixando aflito?"
   "É justamente essa vida de cão, a dificuldade de comprar todo dia o pão; sabe senhor? Eu não pude estudar, tinha que carpir a lavoura desde criança, ajudar na plantação. Hoje eu tenho um filho pequeno, mas não quero essa vida pra ele não, eu me viro como posso, pra melhorar minha situação."
   "Nessa vida a gente tem que se virar mesmo com o que tem, mas sem nunca desistir de ver a beleza, a gente busca no copo um alívio e uma certa clareza", o velho discursou demonstrando seu vasto conhecimento empírico, "o homem tem de trabalhar e aproveitar tudo que tem, se lhe derem limões, encontre uma cachaça, faça uma caipirinha sem açúcar, pra rasgar a garganta e melhorar a voz,
em seguida cante e deixe se levar pelo ritmo, bata palmas para acompanhar a música e depois dance, dance com tamanha liberdade, que nesse momento já não serão mais necessárias as palmas, dance com as mãos livres a buscar o espaço vazio, e em meio a tamanha beleza de canto e movimento, seu corpo vai suar, eliminar tudo que é ruim e emanar uma energia tão boa, que aquele que o visse em tal estado, poderia afirmar que o viu sob a presença de um deus."
   Dito isso, o velho virou a dose na garganta e bateu o copo com força no balcão, como quem bate o martelo no decreto de uma sentença.



sábado, 25 de janeiro de 2014

Trechos de diálogos: No sanatório.

    Um balão solto no ar deixou-se levar com o vento, elevando-se ao alto e distanciando-se da cidade abaixo, um simples e pequeno balão vermelho de borracha, cheio com gás hélio sobrevoou boa parte da cidade e no instante em que estava acima do sanatório chamou atenção de dois pacientes.
    Eles estavam sentados num banco do jardim e ao avistarem o invólucro vermelho pairando sobre os céus, logo começaram a apontar e comentar entre si.
    "Ah os balões", disse um deles, "tão cheios e coloridos, pendurados na parede sempre me lembram festa, inflados com o ar dos pulmões; balões me lembram infância e aniversários, balões me lembram do estrondo que fazem ao estourar e de como os garotos mais treteiros, vinham sempre com um palitinho em mãos, praticamente escondido entre os vãos dos dedos, prontos para acabar com a felicidade de qualquer criancinha menor".
    "Não quero tirar seu sorriso dos lábios meu caro amigo", respondeu o outro com certo ar de superioridade, "mas suas palavras me fizeram refletir sobre a vida".
    "Sobre a vida?" Demonstrou espanto.
    "Sim sobre a vida", afirmou com serenidade e completou, "sobre o homem".
    "Como assim?" Ainda estava atônito, porém seu amigo respondeu calmamente, com ar pedagogo.
    "Os homens são como os balões; uns tem por cor o azul, outros o vermelho, nós crescemos e não obstante, queremos nos inflar com o ar alheio e exibir nossas cores e opiniões; o pior é que nos esquecemos".
    "De quê? Não, eu já sei", e tornou a rir quase triunfante, "nos esquecemos de que quanto mais a gente infla, mais próximo está de estourar!"
    "Você tem uma boa linha de raciocínio meu caro, parece que está mesmo entendendo o que estou falando", tornou a dizer com paciência, "mas não é ai que eu quero chegar".
    "Então quer chegar aonde?"
    "Ao palito"
    " O quê?" disse o que já estava quase perdendo de vez os sentidos.
    "Ao palito, aquele que vem na mão do moleque treteiro, escondido entre os vãos dos dedos, sorrateiro; basta um toque seu e o mais belo balão na mão da mais bela criança se vai, e seu estrondo a faz chorar, sua desintegração também, torna-se um pedaço de borracha velho, sem cor e sem credo."
    "Que analogia maravilhosa!"
    "Ora também não é para tanto, vi isso em suas palavras. A que horas vão servir o chá?"

    Carlos Eduardo Taveira.